É
pouco para quem gosta de velocidade. Até onde ele pudesse correr,
este é o seu limite. Radar não existe para ele, impunidade tão
pouco. Naquele dia porém, achei que eu fosse morrer.
Eu
no portão de casa, ele passou a pé:
-
Bom dia vizinho.
-
Bom dia Fausto – achando que nunca me cumprimentaria, apesar de
sermos vizinhos há bastante tempo.
Fausto,
asfalto, fast,
rápido...
Me passou essa bobeira pela minha cabeça.
Ouvia
falar dele e as peripécias na direção do carro, os cavalos de paus
que ele dava quando era mais novo com o carro do pai, aqui na rua, e
a reclamação de vizinhos por causa das crianças que brincavam na
calçada: um perigo.
Sabia
o nome dele, mas ele não sabia o meu.
-
Prazer, me chamo Henrique ao seu dispor.
-
Pois é né. Somos vizinhos e nunca nos falamos – dizendo e
agitando o molho de chaves na mão, para que eu ouvisse o barulho,
chamando minha atenção para o carro estacionado do outro lado da
calçada.
-
Gostou? É um Range Rover Sport.
Pelo
pouco que eu sei vi tratar – se de um motor diesel.
-
Qual a velocidade que ele faz? - perguntei curioso.
-
Máxima de 210 km por hora. Gostaria de dar uma volta comigo? Preciso
ir até Sorocaba e entregar uma mercadoria para um cliente.
Não
pensei duas vezes e aceitei o convite.
-
Sabe, sou gerente de um grande laboratório farmacêutico e estou me
dando bem.
Entrei
no carro e a lavanda de desodorizador para automóvel, me agradou.
Bancos revestidos em couro, sentei atrelando o cinto de segurança.
Ele fez o mesmo, dando a partida. Ligou o condicionador de ar e me
senti a vontade, muito confortável, de certo que faríamos uma
excelente viagem, uma sensação boa.
Também
vou e volto do trabalho de ônibus, e raras as vezes em que pego um
táxi, somente mesmo para levar meus pais ao médico.
Na
estrada, observei que o pé dele “calcou” no acelerador me
parecendo depois, que o carro seguia sozinho pela estrada. Piloto
automático?!
Uma
das mãos na direção e outra no celular. Câmbio automático?!
Bem,
brincadeiras a parte, minha apreensão aumentava a cada instante.
Há
bem pouco tempo, eu também dirigia meu carro, porém devido o alto
preço da gasolina e desempregado, precisei vendê – lo.
Assim
como meu pai que foi quem me ensinou a dirigir, eu também, mesmo sem
pegar no volante, ainda sei como dirigir. Por mais que mudem as leis
de trânsito ou as altas tecnologias que aparecem a cada dia no setor
de automóveis, sei a maneira correta na direção: as duas mãos no
volante, atenção nos retrovisores, não ultrapassar faixas
contínuas, etc, etc., é o mínimo.
Quem
quiser que acredite: nunca bati o carro ou levei multa. Hoje as
pessoas são imprudentes, não obedecem as leis , e o pior: abusam
da bebida que contribui para muitos acidentes nas estradas e na
cidade tambeḿ.
Voltando
à viagem, ele fazia o trajeto e dirigia com uma mão só e a outra
no celular, e o carro parecendo pedir mais velocidade, visto pelo
barulho da rotação do motor:
Vruummmmmmmmvrummmmmmmmmvruuuummmm
-
Mensagens? - gritando, pois o som que vinha de um clip que ele
colocou para tocar no DVD desde que saímos, não daria para ele
ouvir o que eu estava dizendo.
-
Trata – se de um aplicativo que vai nos levar por um caminho mais
curto.
-
Tipo GPS? - lembrei, meio que fora da tecnologia.
Sou
do tempo dos guias de rua e de mapas dentro do porta – luvas. Como
é antigo: porta – luvas.
-
Sim, vai nos levar rapidinho até lá – disse instantaneamente.
E
assim durante a viagem, reparei uma, duas, três passadas de entradas
para chegarmos à Sorocaba.
-
Nossas estradas são bem sinalizadas – comentei.
De
fato ninguém se perde. Estava tentando desviar os olhos dele do
celular e para que ele pudesse prestar mais atenção no que estava à
nossa frente.
-
Já estamos chegando – disse – me.
Assim
que ele disse “já estamos chegando”, uma carreta, voando pelo
meu lado direito, logo dando o sinal do pisca, cortou a frente do
carro para pegar a pista onde estávamos.
Em
alta velocidade, Fausto ainda tentou reduzir a marcha, pisando menos
no acelerador, porém a única saída foi jogar o Range Rover para
cima do guardirreio.
Bateu...
Ao
se recuperar do susto, mesmo com a cabeça no encosto do banco, girou
a chave no contato: uma, duas vezes e mais uma vez.
-
O motor não quer pegar? - perguntei me recuperando do susto.
-
Não, morreu...