Uma historinha das
arábias
Ele chegou ao Brasil com quinze anos de idade. O pai
dele, o senhor Mustafá estivera em outras ocasiões na cidade de São Paulo, e
foi assim, numa destas visitas, que conheceu Zulmira, mãe de Mohamed. Casou –
se aqui mesmo em território brasileiro e levou – a para Riade capital e maior
cidade da Arábia Saudita.
Portanto, Mohamed é filho de um árabe com uma brasileira.
Desta vez, o senhor Mustafá, trouxera a família toda. Foi
intimado pelos irmãos mais velhos para trabalhar nos negócios da família. Do
outro lado do mundo também, a vida do senhor Mustafá não andava muito “bem das
pernas”.
Ao chegar aqui no Brasil, Mohamed acostumou – se
rapidamente. Cresceu junto com os primos. Os pais dele nem haviam percebido,
mas o tempo passou. Mohamed quase adulto quis ser diferente dos primos e amigos
que o rodeavam na comunidade árabe, por isso resolveu sair de casa. Como disse
Dona Zulmira:
- Para aventurar –
se.
As palavras foram muitas, para convence – lo a ficar em
casa morando e fazendo vida com os pais. O futuro dele estava garantido, mas
nada o fizera mudar de ideia.
Saiu de casa para morar numa pensão logo que arranjou um
trabalho de repositor de mercadoria num pequeno supermercado. Resolveu mudar –
se para perto do emprego porque facilitaria bastante sua ida e vinda, não
precisando tomar conduções lotadas. Dava para ir e voltar a pé.
E foi assim que conheci Mohamed: dentro do supermercado
colocando maçãs na prateleira, até cair uma delas no chão.
A maçã rolou por uma ou duas vezes, até eu pega – la do
chão e entrega - la nas mãos de Mohamed.
- Obrigado.
Agradeceu – me, colocando a maçã delicamente no lugar
como se fosse uma pedra preciosa. Antes que me desse às costas, observei o
rosto dele. Os olhos de cor preta, a pele da cor de um moreno diferente. Li o
nome escrito no crachá.
Institivamente pronunciei:
- Mohamed.
- Pois não!
- Quem te deu esse nome?
- Meu pai – respondeu – me secamente, dando – me as
costas novamente, para continuar o seu trabalho na prateleira.
No outro dia, ele estava lá.
- Bom dia, Mohamed.
- Bom dia senhorita.
Como é gostoso pronunciar esse nome, pensei.
- Morraamed – disse em voz alta.
- Pois não senhorita.
- Não é nada – respondi.
Arrisquei dizer:
- Não vai me dizer que você veio das arábias...
Ele riu e me disse:
- Eu vim das arábias sim, mas é uma longa história.
Percebi o sotaque de árabe, que soavam aos meus ouvidos
como um som agradável. Lembrei-me da cidade de Bagdá, as historinhas de Ali
Babá, Sherazade e as Mil e Umas Noites e então me engracei.
Ficamos um bom tempo sem nos vermos até que um dia entrei
na lanchonete ao lado do supermercado. Mohamed estava sentado numa das mesas
com o cardápio nas mãos. Como a lanchonete estava lotada, assim que ele me viu,
me convidou para sentar à mesa junto com ele. Pedimos dois sucos e X- burgers.
Entre perguntas e respostas, compreendi toda a sua
história, sempre me chamando a atenção, o sotaque dele.
Para minha surpresa, ele perguntou:
- Gostaria de aprender o alfabeto árabe?
Sem ter como negar e aprender
nunca é demais, aceitei.
- Aprender não só idioma árabe, mas outras línguas
aproximam os povos, faz conhecer gente – me disse.
Encontramos - nos por diversas vezes na lanchonete.
No final das aulas ele me contou que o sonho dele é de
ser um calígrafo, e os que os pais
dele com isso, ficarão orgulhosos...