segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Fantasmas de Botas



Mudamos para uma nova casa e havia algo que não me cheirava bem. A vila era formada por seis casas pequenas de cada lado e a nossa casa era a maior de todas. Ficava no centro de frente ao portão principal assim formando um quadrilátero. O portão costumava ser fechado logo que batia meia – noite e ninguém poderia entrar ou sair a não ser que carregasse a chave consigo. Ás vezes eu saia com os amigos e chegava de madrugada. Encontrava o portão fechado antes da hora e isso me dava nos nervos. Se eu esquecesse a chave, dormiria na rua.
Perguntei - me por diversas vezes, quem fechava aquele portão.
Os vizinhos estavam sempre andando de um lado para o outro da vila, sorrindo para mim e quando não, acenavam com a mão.
Na nossa casa éramos eu, minha mãe e meu irmão caçula. A casa nos foi deixada de herança por um tio que meu pai desconhecia. Como meu pai veio a falecer, a casa ficou no meu nome. Minha mãe adoentada muito fazia para cuidar de meu irmão caçula enquanto eu saia para trabalhar.
Mas como eu disse: algo não me cheirava bem. Comecei a reparar no dia a dia dos vizinhos: nunca abriam as janelas ou portas e quando estavam abertas, pareciam ser o vento que abria. Durante a noite, ouvíamos bater as portas e não conseguíamos dormir. Reparei também no que vestiam. Eram roupas simples, porém todos calçavam botas. Eram crianças, jovens, velhos, todos usavam botas. Da janela do meu quarto, tudo isso eu pude observar, mas quando dei por mim, encontrava - me no meio da vila por entre as pessoas que andavam de um lado para o outro acenando para mim e distribuindo sorrisos. Saí tão depressa de dentro de casa que nem percebi ter descido as escadas. Num impulso, agarrei uma criança que passava, mas não consegui segura – la. No mesmo gesto tentei agarrar uma senhora e tendo a mesma sensação, um vácuo passou pelas minhas mãos.
- Fantasmas! - pensei.
Virando - me, olhei para a porta de casa, estavam minha mãe e meu irmão de olhos arregalados vendo meu jeito. Por um instante olhando os pés dos dois, me deu a impressão que estavam de botas também, mas foi só impressão. Abracei – os junto ao meu corpo para sentir que estavam ali e puxei os dois por toda a vila até chegarmos para fora do portão bem longe dali. Os dois não entenderam, mas a vila era cheia de fantasmas e todos calçavam botas. Pernoitamos na casa de um parente e no dia seguinte soubemos que a vila seria implodida, porque a vila para minha surpresa, há muitos anos não era habitada, e quem morava na nossa casa era um magnata chamado Frederico Ferreira, que obrigava seus empregados - que moravam na vila - a usar todas as botas que ele fabricava.


Frederico Ferreira tem algo para contar sobre essa história que Felipe contou. Assista ao vídeo e surpreenda -se com o final.


Versos cantados
Felipe contou a história
mas a história não é bem assim
Meu pai fabricava as botas
ele era um homem ruim

Deixava as pessoas descalças
trabalhavam até não ter fim
Não podiam comprar suas botas
ele era um homem ruim

Fantasmas de botas nós somos
mas não é pra ninguém se assustar
Fantasmas de botas voltamos
para esta história explicar

Depois que meu pai morreu
magnata tornei – me sim
Todos riram da minha cara
mas eu não era um homem ruim

Calcei todos meus empregados
agradeceram e felizes ficaram
E todos em minha homenagem
as botas eles usaram

Fantasmas de botas nós somos
mas não é pra ninguém se assustar
Fantasmas de botas voltamos
para esta história explicar

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